13 março 2010

Paguem a conta por favor

 
Gosto de corridas e é legal que a Indy volte ao Brasil. Mas não do jeito que voltou, com tudo sendo feito às pressas. Quem quiser fazer corridas, que faça. Mas que pague a conta, por favor

Flavio Gomes no grandepremio/PortalIG

Não há nada mais importante acontecendo no Brasil neste fim de semana, em termos de esporte, do que a SP Indy 300, a abertura do campeonato que procura voltar aos seus bons tempos dos anos 90. E tem conseguido, aos poucos, depois da fusão entre IRL e Cart. Há uma maior variedade de circuitos, uma certa internacionalização no elenco de pilotos, embora não seja possível, ainda, comparar a turma que corre atualmente com aquela que tinha, por exemplo, Nigel Mansell e Emerson Fittipaldi. Era outro nível.

Em tempo muito curto, os organizadores conseguiram montar uma pista em torno e dentro do Sambódromo do Anhembi. O traçado não é nem bom, nem ruim. Apenas normal — por se tratar de um circuito urbano, tem as esquinas de sempre, a crônica falta de espaço para ultrapassagens, as muretas e alambrados que são tão comuns nos EUA e produzem tantas batidas.

São Paulo, a cidade, não tem muito o que mostrar na região onde vai ser disputada a corrida. É um lugar feio, ao lado de um rio podre que envergonha quem mora aqui. Desconfio que o Tietê não vai aparecer para os mais de 200 países que, dizem, receberão as imagens da TV. A grande vitória foi, mesmo, fazer tudo na correria para que, sábado, haja condições para que carros de corrida andem ali.

E haverá, e é claro que o evento, por ter como promotor a emissora de TV que o transmite, será elogiado, glorificado e deitado no olimpo. O mesmo farão os pilotos, porque o espírito americano da Indy é esse mesmo, achar tudo legal, great job, os caras não reclamam de nada, vão notar as ondulações no asfalto, mas vai ficar por isso mesmo, faz parte do espetáculo. E alguns elogios serão sinceros e merecidos, sem dúvida. Usar o pavilhão de exposições como garagens é uma boa sacada, embora óbvia, assim como utilizar o hotel que fica no complexo, e outras instalações já prontas. É o oposto do mau-humor crônico da F-1, onde todo mundo reclama de tudo.

Enfim, se São Paulo, uma cidade quase inviável, tem um lugar para fazer uma prova dessas que não atrapalhe demais sua vida insuportável, é o Anhembi. O trânsito ali não anda mesmo, um dia a mais, um a menos, não vai fazer grande diferença.

Gosto de corridas e é legal que a Indy volte ao Brasil. Mas não do jeito que voltou, com tudo sendo feito às pressas, os gastos públicos mal-explicados para viabilizar um evento privado, numa cidade que tem um trânsito que se arrasta à média galinácea de 15 km/h e onde é impossível percorrer 100 metros sem cair num buraco. A Prefeitura tinha falado em torrar R$ 12 milhões. O prefeito disse que a fatura já chegou aos 20. O mesmo vale para a F-1. Não é a Prefeitura que tem de pagar a montagem das arquibancadas temporárias em Interlagos. Entregar o autódromo em condições, sim. Afinal, é sua a responsabilidade pela manutenção, e um aluguel é pago. Quem aluga, quer receber as coisas direito. Mas deveria ser só isso, nada mais.

Voltando à Indy, asfaltaram os mais de 4 mil metros da pista do Anhembi em tempo recorde, enquanto que o resto da malha viária paulistana mais parece Bagdá depois de um bombardeio. Os governantes garantem que a corrida trará 120 milhões de reais para a cidade, um claro chute, mas que seja assim. Quem sabe essa grana possa ser usada para o que São Paulo precisa. Asfaltar ruas, por exemplo. Varrê-las. Cuidar daqueles que nelas vivem, abandonados, esquecidos.

E quem quiser fazer corridas, que faça. Mas que pague a conta, por favor.

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