Dalcídio Jurandir já não é apenas um nome à deriva nas águas da
literatura brasileira, ou paraense, para termos um porto de onde partir.
Com três romances recentemente reeditados, os livros do autor voltaram a
frequentar a seção de lançamento das livrarias – pelo menos nas
livrarias belenenses que restaram.
Muito citado e pouco lido, há muito que a grande maioria dos títulos
do escritor paraense estava esgotada. Das novas gerações, quem se
interessasse em conhecê-lo dificilmente toparia com um volume do autor.
Em 2004, com a reedição daquele que é, em geral, considerado seu mais
importante romance, “Belém do Grão-Pará” – em coedição da Editora da
Universidade Federal do Pará (Edufpa) e Casa Rui Barbosa –, a orfandade
do leitor diminuiu. Pena que a distribuição do livro tenha sido
precária. No ano passado, foi a vez de “Marajó” retornar à luz, também
em coedição Edufpa e Casa de Rui Barbosa.
Agora, no centenário de nascimento do autor – nasceu em Ponta de
Pedras, no Marajó, em 1909, e morreu no Rio de Janeiro, em 1979 –, a
Editora da Universidade Estadual do Pará (Eduepa) lança, na próxima
terça-feira, o romance “Primeira Manhã”. Publicado originalmente em
1968, pela editora Martins, sexto romance da série Extremo-Norte –
composta de dez volumes: “Chove nos Campos de Cachoeira” (1941),
“Marajó” (1947); “Três Casas e um Rio” (1958), “Belém do Grão-Pará”
(1960), “Passagem dos Inocentes” (1963), “Primeira Manhã” (1968), “Ponte
do Galo” (1971), “Os Habitantes” (1976), Chão dos Lobos (1976) e
Ribanceira (1978) –, o livro chega vestido a caráter para a celebração
da data, numa caprichada edição, com texto atualizado e bela
apresentação gráfica, com capa baseada numa pintura de Ismael Nery.
O cuidado com os critérios editoriais de “Primeira Manhã” inclui uma
série de textos sobre o autor, escritos especialmente para esta edição
por especialistas na obra de Dalcídio. Vale ressaltar que um desses
artigos, assinado pelo escritor e crítico mineiro Antonio Olinto, da
Academia Brasileira de Letras, foi um dos últimos textos que o autor da
trilogia “Alma da África” deixou para ser publicado. Olinto,
contemporâneo de Dalcídio, morreu no último dia 12 de setembro, aos 90
anos, no Rio de Janeiro. Neste artigo, intitulado “Dalcídio, o
romancista de um povo”, Olinto diz que o romancista marajoara, dono de
seu chão, “incorpora todo o mundo amazônico, numa visão geral da terra,
da gente e dos ódios e amores que as envolvem”.
No artigo “‘Primeira Manhã’, as culpas soterradas de Alfredo”, a
professora Marli Tereza Furtado, da UFPA, nota que “o romance ‘Primeira
Manhã’, sexto livro do ciclo Extremo Norte e quinto em que Alfredo
aparece como protagonista, poderia agrupar-se aos três títulos que o
sucedem (‘Ponte do Galo’, 1971, ‘Os Habitantes’, 1976, ‘Chão dos Lobos’,
1976) e formar a tetralogia das perambulações de um ginasiano culpado”.
Alfredo, personagem central do romance, vive a sua tão cobiçada
primeira manhã de ginásio, entre acontecimentos e impressões que lhe
ferem fundamente a adolescência.
Por sua vez, Paulo Nunes, professor da Unama e dedicado leitor da
obra dalcidiana, observa, em “Amanhecer, as calças curtas dependuradas
no varal”, que se pode falar de “Primeira Manhã” “como um romance-rito,
rito de passagem; um romance-grito, grito dos excluídos”; um romance
ficto-facto, ficção e realidade se enovelando para dar conta das
contradições humanas na grande planície pan-amazônica”.
A nova (e segunda) edição do romance oferece ainda um glossário, preparado pela professora Rosa Assis, uma lista de topônimos, a cargo de Fernando Farias e Nilson Bezerra Neto – explicando a origem, situando e, quando é o caso, atualizando localidades e edificação em Belém e no Marajó –, a explicação dos critérios editoriais adotados e reprodução de textos e capa da primeira edição.
A nova (e segunda) edição do romance oferece ainda um glossário, preparado pela professora Rosa Assis, uma lista de topônimos, a cargo de Fernando Farias e Nilson Bezerra Neto – explicando a origem, situando e, quando é o caso, atualizando localidades e edificação em Belém e no Marajó –, a explicação dos critérios editoriais adotados e reprodução de textos e capa da primeira edição.
O lançamento de “Primeira Manhã” abre a série Memórias Reeditadas,
selo da Eduepa destinado à publicação de obras literárias ou
científicas, referentes à Amazônia e de relevância acadêmica, fora de
catálogo. Para falar sobre o lançamento de “Primeira Manhã” e da coleção
que o romance inaugura, entrevistei a professora Josebel Akel Fares,
organizadora do volume e coordenadora da Eduepa. Publico ainda a
programação em torno do lançamento do romance e palestras tendo como
tema a obra e a vida de Dalcídio Jurandir que serão realizadas durante o
III Simpósio de Letras da Universidade do Estado do Pará.
E o mais importante: com a reedição de Dalcídio Jurandir, espera-se
que a crítica desperte (junto com o leitor) para a obra do autor, para
que esta, reavaliada em seus achados e desencontros, reencontre seu
espaço no cenário da literatura nacional.
(Diário do Pará)
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