13 setembro 2013

Feras do Futebol Paraense / Ageu Sabiá

Por Gustavo Pêna Belém( Globo Esporte)
Ex-atacante com passagens por Remo, Paysandu e Tuna Luso era desengonçado, com pernas finas e também sofria problemas com o peso
Desengonçado, com as pernas finas e uma barriga um tanto avantajada, o que rendeu o apelido de Sabiá. Para muitos, à primeira vista, Ageu poderia ser tudo, menos um jogador de futebol. Mas bastavam alguns minutos em campo para o atacante mostrar que era um artilheiro nato, capaz de pegar a bola na linha intermediária, deixar os zagueiros no chão e sair para comemorar o gol com a torcida. Hoje com 46 anos, Ageu Sabiá se diverte contando as histórias que o transformaram em um dos maiores mitos do futebol paraense.
Artilheiro por dois anos seguidos do Campeonato Santareno de 1986/87, Ageu chamou atenção do diretor Walter Abél, da Tuna Luso, que tinha viajado a Monte Alegre-PA. Assim que viram o biotipo do atleta, até então desconhecido, jogadores, comissão técnica e até os repórteres que cobriam o dia a dia do clube riram e se perguntavam: como uma pessoa acima do peso poderia se aventurar a jogar profissionalmente?
- No início foi muito difícil. A desconfiança era muito grande. Ninguém acreditava no meu potencial. Mas bastaram os primeiros treinamentos para que eu provasse o contrário. Quando viram que, mesmo tendo uma barriga saliente, eu conseguia fazer as jogadas de velocidade e finalizar com precisão, as pessoas começaram a me respeitar. Costumo dizer que jogador habilidoso, velocista, inteligente e, claro, gordinho, só existe um: Ageu Sabiá – conta, sem cerimônia.
Ageu Sabiá nunca abriu mão de refrigerante com pastel
Com 1,67m de altura, Ageu afirma que o seu peso ideal era de 65 kg, mas que chegava a entrar em campo pesando 75 kg. De acordo com ele, esses 10 kg a mais não atrapalhavam em nada na hora da partida. Sabiá confessa que a alimentação nada saudável ajudava no ganho de peso. O jogador adorava comer hambúrguer, churrasco, pastel, refrigerante e ainda se aventurava em tomar alguns copos de cerveja. - Eu deixava os treinamentos e atravessava a rua para comer hambúrguer. Se não tinha, o jeito era comer pão com manteiga e refrigerante. Aquela cervejinha também não podia faltar. Os preparadores físicos sabiam disso, mas não me questionavam, pois tinham consciência que dentro de campo eu me garantia. Eles não me botavam para correr seis quilômetros igual os outros. Eu fazia treinos específicos. No campo, corria 100 metros em dez segundos. Poucos jogadores conseguiam isso.
Da Tuna, Ageu jogou no Paysandu, onde ajudou os bicolores a conquistarem o acesso à Série B em 1990, mas foi no Clube do Remo que o atacante ganhou a fama de “carrasco”, principalmente quando enfrentava o Papão. No Leão, o jogador foi o artilheiro no pentacampeonato estadual e um dos principais personagens no tabu de 33 jogos de invencibilidade no clássico Re-Pa. - Respeito o Paysandu, tenho carinho pela Tuna, mas sou torcedor do Remo. Meu diferencial era fazer gol em Re-Pa. Podia passar muitos jogos sem fazer gol, mas bastava fazer um no Re-Pa que a gente era rei. Sou um dos maiores artilheiros do clássico, com 48 gols. Jogando pelo Remo, em 1993, ficamos entre os oito melhores times da Primeira Divisão, comigo disputando a artilharia da competição. Guardo na memória um gol que marquei pelo Leão, diante da Desportiva, do Espírito Santo, quando driblei todo mundo e o meu gol foi eleito o mais bonito no programa Fantástico.
Em 1993, a gente iria enfrentar o Goiás no Serra Dourada e um repórter veio me dizer que era difícil ganhar deles lá dentro. Eu só fiz responder: ‘Difícil é dar rasteira em cobra e cachuleta em jabuti. O resto é fácil’" Ageu Sabiá
‘O cavalo é barrigudo e também corre’ Folclórico, Ageu Sabiá é cheio de histórias engraçadas e frases de efeito que ficaram marcadas em razão da barriga avantajada. A mais conhecida delas aconteceu em 1993, quando Remo e Portuguesa se enfrentaram no Estádio do Canindé, pelo Brasileiro. - O repórter veio me entrevistar e perguntou como eu poderia correr com aquela barriga toda. Olhei para ele e disse: ‘O cavalo é barrigudo e também corre’. Também em 1993, a gente iria enfrentar o Goiás no Serra Dourada, e um outro repórter veio me dizer que era difícil ganhar deles lá dentro. Eu só fiz responder: ‘Difícil é dar rasteira em cobra e cachuleta em jabuti. O resto é fácil’. Eu desembarcava do ônibus para treinar e as pessoas pensavam que eu era o roupeiro do time. Eu deixava pensarem e respondia dentro de campo. Todo mundo ficava boquiaberto quando marcava os gols.
Fama de ‘gordinho’ atrapalhou a ida para clubes do Sul e Sudeste Como todo jogador, Ageu tinha o sonho de jogar nos grandes clubes do eixo Sul e Sudeste. No fim da carreira, o atleta teve passagens rápidas pelo Noroeste e São Carlense. Segundo o artilheiro, o preconceito era a principal barreira para conseguir uma oportunidade em grandes equipes como Flamengo, São Paulo, Corinthians e Grêmio. Em 1994, por exemplo, Sabiá esteve perto de fechar com a Portuguesa. Ele teve que se contentar em encerrar a carreira em 2004, pelo Ananindeua-PA.
Ageu encerrou a carreira em 2004, pelo Ananindeua
- Eu já estava me preparando para viajar a São Paulo, quando o técnico Candinho foi demitido e um outro foi contratado, e não quis mais me levar. As pessoas sabiam da minha fama de atacante artilheiro, mas também ouviam falar que eu era gordinho. Acredito que os presidentes dos clubes tinham medo de apostar no meu futebol e as coisas não darem certo. Os dirigentes comentavam que eu era gordinho demais. Mas isso nunca me entristeceu. Meu negócio mesmo era jogar e fazer gol, fosse no Pará ou na Europa, não me importava com o lugar. 'Se deixarem, o Walter é artilheiro na Seleção Brasileira’
O Campeonato Brasileiro ainda está na metade, mas Ageu Sabiá já elegeu o craque da competição: Walter. Ageu vê no gordinho do Goiás as mesmas características que tinha quando jogava. De acordo com ele, Walter nunca vai conseguir emagrecer e, mesmo estando acima do peso, vai continuar balançando as redes adversárias. - As pessoas vinham falar que o Walter jogava igualzinho como eu. Comecei a assistir os jogos e perceber que realmente era parecido na velocidade e na habilidade dentro da área. Os jogadores fazem com o Walter exatamente o que faziam comigo: me deixavam de lado, não confiavam no meu futebol. Mas é só dar o primeiro traço e fazer o gol que a marcação acontece. Esse atacante do Goiás não precisa emagrecer. Se isso ocorrer, ele para de fazer gol.
Ageu se diverte contando as suas histórias no futebol. Para ele, o atacante Walter, do Goiás, merece uma oportunidade na Seleção Brasileira (Foto: Gustavo Pêna) Assim como grande parte dos torcedores, Ageu pede que o técnico Felipão dê uma oportunidade para Walter no ataque da Seleção Brasileira. Segundo ele, o Tufão tem espaço no time na equipe canarinho, mas trata logo de avisar: o seu posto de verdadeiro gordinho artilheiro nunca vai ser tomado. - O Walter tem totais condições de jogar na Seleção Brasileira. Se deixarem, ele vai ser artilheiro. É um excelente jogador, oportunista, e o nosso time está precisando de um atleta com essas características. É um exímio ‘matador’, vai dar certo, com certeza. Mas é bom que as pessoas saibam de uma coisa: o verdadeiro gordinho artilheiro mais famoso do Brasil sou eu. O Walter é o segundo – se diverte Sabiá.

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